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São João Batista

25 jun

Nascimento SãoJoãoEste mês a Igreja celebra, dentro do seu calendário litúrgico, a memória dos santos que são homenageados nas festas juninas. A história deles, no entanto, é reverenciada pelo testemunho que deram em favor do evangelho e do seu anúncio. Em diferentes momentos da história, e com particularidades próprias, cada um deles pôde levar adiante o mandado deixado por Jesus Cristo: “Como o Pai me enviou, também eu vos envio” (Jo 20,21).

Embora todos os santos juninos sejam importantes, quero destacar aquele que foi o precursor de Nosso Senhor Jesus Cristo: João Batista. Ele é tão relevante que a Igreja faz memória do seu martírio (29/08) e festeja seu nascimento (24/06) de modo solene.

A vida de João Batista, como os evangelhos narram, é marcada pelo anúncio da vinda do messias e pela denúncia do modo de vida das pessoas. Ele próprio se identifica como a “voz que clama no deserto”. Quer dizer, João era a palavra que gritava no deserto, mostrando à sociedade a necessidade de andar em novos caminhos.

Na solenidade do nascimento de João Batista, um profeta, um homem da palavra, existe um convite para olharmos a Igreja do ponto de vista profético. A Igreja tem consigo a missão de ser profética e, por isso, ela tem uma palavra que nem sempre é ouvida ou, na maior parte das vezes, mal ouvida e mal interpretada. Aquilo que aconteceu com os profetas do Antigo Testamento, o que aconteceu com João Batista e com o próprio Jesus, acontece com a Igreja. É perseguida, é mal compreendida, é contestada por um único motivo: porque sua palavra profética não se afina com muitos modos de pensar e agir na sociedade atual.

Olhando para João Batista, compreendemos que ele estava no mesmo caminho de Isaías; que Paulo estava no mesmo caminho de João Batista e que a Igreja, continua nesse caminho para ser fiel à vocação profética de dizer a palavra que não é dela, mas de Deus, em vista de preparar um povo santo para o Senhor.

A importância de João é também reconhecida pelo próprio Jesus que tece elogios a ele, segundo aponta o evangelista Lucas: “Jamais surgiu entre os nascidos de mulher alguém maior do que João Batista”. A Igreja também o lembra como o último dos profetas, encerrando assim a tradição profética do Primeiro Testamento.

Por isso é que na festa de São João, o ponto central é o acendimento da fogueira, pois esta recorda aquela primeira feita pelos pais de João para comunicar o seu nascimento, sinalizando a ligação entre a antiga e a nova aliança. Essa luz irradiada nos orienta a caminhar nossa vida segundo os desígnios do Cristo, seguir os seus passos e testemunharmos nossa fé, assim como fez o Batista. Aos santos das festas juninas, rogai por nós…

Santa e pecadora na unidade

17 nov

Tempo propício para reavivar a fé!

Durante o período em que vigorar o Ano da Fé (até o Domingo de Cristo Rei de 2013), somos convidados a viver intensamente os elementos fundamentais da nossa fé, a fim de compreender mais e melhor o nosso credo. Hoje, quero abordar duas dimensões da Igreja inerentes ao símbolo da fé: a unidade e santidade.

O Catecismo da Igreja Católica (CIC) afirma que a Igreja é una por intermédio do seu fundador: Jesus Cristo, que “por sua cruz reconciliou todos os homens com Deus, restabelecendo a união de todos num só povo, em um só corpo” (CIC 813). Essa união se dá pela ação e força do Espírito Santo, que une os fieis a Cristo, principio de unidade da Igreja. A unidade não significa uniformidade de culto, de hierarquia ou tipos de teologia. Pelo contrário, a diversidade existente entre membros das comunidades, suas culturas, os dons, nada disso quebra a unidade, mas sim ajuda na sua unicidade, já que todos se colocam a serviço do evangelho sob a custódia do Espírito Santo.

Por diversas vezes ouvimos e lemos que a Igreja é “santa e pecadora”. É pecadora porque todos nós, homens e mulheres, dentro da nossa condição humana, erramos e necessitamos sempre do perdão e da misericórdia de Deus; não há duas “igrejas”: uma santa e outra cujos membros são pecadores. Ser santo significa um povo escolhido por Deus, separado, à parte, não para usufruir de algum benefício particular, mas para em comunidade ser sinal de santidade no mundo.

Como membros dessa Igreja, somos chamados a viver em torno da unidade em Nosso Senhor Jesus Cristo e também na busca de santidade: “Essa é a vontade de Deus, a vossa santificação” (1Ts 4,3). Essa perfeição não se dá de modo mágico, mas segundo nos aponta a constituição Lumen Gentium (Luz dos Povos) – “(…) todos os fieis santificar-se-ão dia a dia, sempre mais, nas diversas condições da sua vida, nas suas ocupações e circunstâncias, e precisamente mediante todas essas coisas, desde que as recebam com fé, das mãos do Pai celeste, e cooperem com a vontade divina, manifestando a todos, no próprio serviço temporal, a caridade com que Deus amou o mundo” (LG 41).

Comentário das leituras da “Ascensão do Senhor”

19 maio

Na Solenidade da Ascensão do Senhor, a liturgia do domingo convida à reflexão sobre o envio de cada um de nós a sermos discípulos e missionários de Jesus Cristo, como testemunhas de sua palavra, “até os confins da terra” (cf. At 1,8). Esse testemunho, conforme Atos dos Apóstolos está amparado na presença e no “poder” e na ação evangelizadora e santificadora do Espírito Santo.

Jesus ascende aos céus, conforme Paulo escreve à comunidade de Efésios, afirmando que “Aquele que desceu é o mesmo que subiu” (cf. Ef 1,10), ou seja, não há distinção entre o Jesus humano e o Jesus divino. Aquele que morreu na cruz é o ressuscitado, que agora, de forma definitiva, estará junto do Pai intercedendo por todos nós.

O Seu ascendimento não deixou seus seguidores abandonados. Ele promete e envia o paráclito, o advogado, o Espírito Santo para nos vivificar na fé e sermos verdadeiras testemunhas do seu amor.

Se o Espírito habita em nós e se somos templo desse mesmo Espírito, não podemos ficar parados diante das injustiças e esperando resposta do “céu”. A nossa prática pastoral deve ser alicerçada pela oração. São duas ações conjuntas, inseparáveis, semelhantes às que o Cristo revelou. Uma sem a outra deixa a nossa fé perneta, descompassada, distante daquilo que São Tiago adverte em sua carta: “A fé sem obras é completamente morta” (cf. Tg 2,17).

No Evangelho, o próprio Jesus faz o envio de seus discípulos “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura” (cf.Mc 16,15). Aos que crerem na mensagem do Evangelho, esses não serão mais os mesmos. A vida não será mais a mesma, sinais de um novo modo de ser e de agir serão visíveis. Os muitos “demônios” incutidos nas relações humanas serão expulsos: todos os tipos de vícios, orgulho, drogas, violência; novas linguagens serão conhecidas: a do respeito mútuo, da solidariedade, da compaixão da misericórdia, todas oriundas do amor; terão, inclusive, o poder de abençoar e curar os doentes. Tudo em nome do Senhor Jesus Cristo, em nome de mais ninguém!

Oração e testemunho da palavra são atitudes comunicacionais de Jesus Cristo. O Papa relembra essa comunicação no Dia Mundial das Comunicações Sociais, comemorado no dia de hoje. “Silêncio e Palavra” são atitudes elementares para o cristão. Escutar a Deus no silêncio do coração, é saber identificar os gritos que surgem diante das injustiças sociais e, à luz da Palavra, como profetas, denunciá-las para que todos possam ter vida ”e vida em abundância” (Jo 10,10). (E.A.C)

Nos passos de Maria para seguir Jesus

27 out

Caminhar com Maria para seguir Jesus” é o título da obra de José Adriano Gonçalves, publicado pela Paulus, São Paulo, no ano de 2010, que integra a coleção Temas Marianos lançada pela própria editora.

O livro apresenta uma espécie de itinerário mariano que deve ser seguido. O objetivo é fazer a experiência do seguimento a Jesus Cristo.  Para alcançar essa meta, o autor esmiuçou a obra em 42 tópicos, pequenos capítulos. A história desenrola-se num crescente de fatos e ações históricas envolvendo Maria e seu Filho, Jesus.

Apesar de o livro não apresentar uma subdivisão por capítulos, é possível notar a preocupação do autor em fazer uma narrativa seguindo os moldes do evangelho. Do capítulo I ao XIII desenrola-se a vida pessoal de Maria, do seu “sim” a Deus até o casamento com José. No XIV capítulo o texto apresenta o nascimento de Jesus, e aí se seguem outros capítulos retratando a vida do messias e da sua família. O ponto culminante desse bloco está entre os capítulos XXX e XXXII, onde é retratada a páscoa de Jesus: prisão e condenação à morte, a sua ressurreição e ascensão; e as dores de Maria. Num terceiro conjunto de capítulos, a figura de Maria é realçada em momentos significativos da comunidade após o evento Jesus Cristo, apontando para o seu caráter de missionariedade e discipulado. Nos capítulos XXXVII e XXXVIII o autor apresenta uma série de depoimentos pessoais, na qual Maria intercedeu para que a graça fosse alcançada. No último capítulo, uma carta de despedida do autor para Maria. É um texto de louvor diante da fragilidade humana, mas que encontra na fé mariana consolo e força para superar as dificuldades.

O autor adota uma dinâmica de apresentação textual interessante. Com a divisão em vários capítulos (41 no total), permite ao leitor a leitura fracionada, com temas independentes. Desta forma, a motivação é partilhada em cada situação vivida por Maria ou Jesus.

Dentre os objetivos propostos pelo autor da obra, posso considerar como fundamental a sua preocupação em destacar a figura de Maria como parte relevante da história da salvação. Para os leitores desse livro, tanto as pessoas engajadas numa comunidade, quanto aos neófitos na fé, não há dificuldades em interpretá-la e entendê-la.

Durante muitos anos o devocionismo mariano foi sobrevalorizado. A partir do Vaticano II, a Igreja pretendeu atenuar essa situação, apontando para a real importância da devoção. Neste sentido “Caminhar com Maria para seguir Jesus” contribui para elucidar o papel que Maria ocupa como mãe de Jesus.

A fragmentação da obra em muitos capítulos dificulta uma apresentação pormenorizada desses. No entanto, quero destacar elementos registrados pelo autor que merecem ser anotados. O primeiro destaque se apresenta no segundo capítulo: a radicalidade da adesão de Maria à proposta de ser a mãe do Senhor. O autor compara esse “sim” de Maria à nossa adesão diária ao chamamento de Deus. Outro elemento chave da obra está no capítulo XI. Além de dizer “sim” a Deus, é preciso constantemente negar tudo que possa nos desviar do caminho de Deus. “(…) que o nosso ‘não’ a tudo o que contraria o Mestre seja autêntico, denunciando profeticamente as injustiças do mundo” (pág. 32). No capítulo XXV o cume da obra: Maria como mediadora e intercessora da fé, mas ela própria afirma “fazei tudo o que Ele (Jesus) vos disser”. Por fim, não poderia deixar de anotar os capítulos que tratam de Maria após o evento pascal de Jesus. Ela presente no Pentecostes, na missão da Igreja primitiva, a sua assunção e a presença do Espírito Santo. Ao final, o autor conclui a obra com relatos e experiências pessoais da presença mediadora de Maria.

Embora o autor enfatize em várias passagens a relevância do evento Jesus de Nazaré, ele não minimaliza a importância de Maria dentro do contexto da história da salvação. “Maria foi mestra de Jesus (…). Ela é o símbolo da fé que vive exclusivamente para Deus (…). Ela é modelo para todos nós, valorizando as pequenas coisas da vida, na simplicidade de viver” (pág. 54). Para José Adriano “Maria não é apêndice, ela é fundamental na execução do projeto em si”.

No afã de equilibrar as correntes mariana e cristológica, o autor é capaz de afirmar numa sentença que Maria é “o caminho mais direto, curto e rápido para Cristo”, e contradizê-lo no parágrafo seguinte: “É bom ressaltar que Maria não faz milagres. Ela é criatura como nós” (pág. 118).

O autor adota uma postura de equilíbrio ao tratar de Maria e Jesus. Essa é a ideia central da obra. Ele a defende, em todos os capítulos, ora apontando para a cristologia soteriológica, ora enaltecendo as intercessões marianas. Do ponto de vista textual o autor cumpre satisfatoriamente seu intento, embora cometa exageros, como os verificados nos capítulos XXVIII e XXXIX. No entendimento algumas considerações, a começar pelo título do livro. Por que não caminhar como o Mestre caminhou? Viver como Jesus viveu? Amar a Deus como Ele amou? Maria assim o fez, claro, e por isso é um modelo de fé para a Igreja. Nós também podemos fazer esse itinerário cristológico, direto, acompanhado pelo Senhor. Outro ponto a considerar são as comparações, demasiadas, com Maria.

O autor quer ressaltar que “caminhar” com Maria o acesso ao Filho é imediato, mas no excesso comparativo dá a entender que ela é a única “ponte” para Jesus.

Mesmo com essas ressalvas, em nada diminui a importância e a contribuição teológica que a obra proporciona. Aliás, o livro vai ao encontro do que apontou o Santo Padre Papa Paulo VI: “Antes de mais nada, a Virgem Maria foi sempre proposta pela Igreja à imitação dos fiéis, não exatamente pelo tipo de vida que ela levou ou, menos ainda, por causa do ambiente sócio-cultural em que desenrolou a sua existência, hoje superado quase por toda a parte; mas sim, porque, nas condições concretas da sua vida, ela aderiu total e responsavelmente à vontade de Deus (…).” (Por Eduardo Araújo de Castro, 4º Teologia – Noturno)